quinta-feira, 9 de outubro de 2008

Proteína luminosa dá Nobel de Química a biólogos dos EUA



Extraída de água-viva, a GFP virou uma das ferramentas mais úteis da biologia, permitindo ver a atividade de genes

Para comitê do prêmio, descoberta de trio teve impacto comparável ao da invenção do microscópio sobre o avanço da ciência

Sam Yeh/France Presse

Peixes transgênicos fluorescentes foram feitos com inserção de gene que produz a proteína GFP

CLAUDIO ANGELO
EDITOR DE CIÊNCIA
RAFAEL GARCIA
DA REPORTAGEM LOCAL

O Prêmio Nobel de Química de 2008 foi concedido ontem a uma idéia literalmente brilhante. Seus ganhadores são três cientistas dos EUA que transformaram uma água-viva esmagada na ferramenta de escolha de dez em cada dez laboratórios de biologia molecular -uma proteína fluorescente que revolucionou o estudo dos genes e das células.
O japonês Osamu Shimomura, pesquisador aposentado do Laboratório de Biologia Marinha, em Woods Hole, e os americanos Martin Chalfie, da Universidade Columbia (Nova York) e Roger Tsien, da Universidade da Califórnia em San Diego, compartilharão o prêmio de 10 milhões de coroas suecas (cerca de US$ 1,4 milhão) e a glória por terem descoberto e aplicado à biologia a GFP, sigla em inglês para proteína verde fluorescente.
Só mesmo dinheiro e glória, porque a gratidão eterna dos biólogos eles já tinham: afinal, o uso da GFP como sinalizador molecular, que tem a capacidade de iluminar só as células escolhidas, permitiu enxergar processos dentro do organismo que até então eram invisíveis.
Graças à GFP, os cientistas conseguem hoje ver onde e quando no organismo um gene ou um conjunto de genes se ativa; conseguem iluminar o crescimento de um tumor; acompanhar a migração de células individuais num embrião em desenvolvimento; e enxergar até mesmo processos que ocorrem dentro da célula, para ajudar no desenvolvimento de drogas.
O uso da proteína fluorescente ultrapassou até mesmo os laboratórios de biologia. Invadiu o mundo dos bichos de estimação, com a produção de peixes de aquário transgênicos brilhantes, e as artes plásticas, com a criação, no começo do século, de uma coelha verde fluorescente, Alba, pelo artista brasileiro Eduardo Kac.
O comitê do Nobel comparou o feito do trio à invenção do microscópio, no século 17, pela dimensão do novo universo que se abriu. Shimomura, porém, afirma que não imaginava que seu trabalho ganharia tanta projeção, quando conseguiu isolar a GFP de águas-vivas. Em 1962, ele publicou um trabalho revelando que a proteína emitia um forte brilho verde quando submetida à luz ultravioleta.
Quem deu o salto conceitual, porém, foi Chalfie, que em 1992 inventou uma maneira de ligar o gene da proteína a genes específicos de outros organismos. Amostras de tecido e animais geneticamente alterados poderiam ser usados para estudar fenômenos escolhidos a dedo.
Se o gene escolhido para observação produzisse uma proteína ligada ao câncer, por exemplo, era possível ver onde e quando ela surgia no organismo de uma cobaia. Uma idéia tão versátil não levou muito tempo para se tornar uma ferramenta popular em toda a biologia celular e molecular.

Cores bonitas
A técnica se tornou ainda mais poderosa quando Tsien, 56, elaborou em 1996 uma maneira de ampliar a paleta de cores de proteínas usadas na técnica. Além do verde surgiram proteínas azuis, depois vermelhas, e outros cientistas estenderam a técnica para todas outras tonalidades. Uma técnica nova chamada "brainbow" já usa todas as cores do arco-íris para diferenciar neurônios.
Tsien diz que ainda não teve tempo de pensar sobre o impacto do Nobel em sua vida. "Fundamentalmente, não sou mais esperto hoje do que eu era ontem", disse o cientista, que confessa ter sido atraído pelo lado lúdico da GFP. "Eu gosto de cores bonitas, e essa era uma boa oportunidade."
"Merecidíssimo", diz o biólogo brasileiro Alysson Muotri, da Universidade da Califórnia em San Diego. Ele mesmo recorreu à GFP para iluminar genes saltadores no cérebro de mamíferos, em 2005, e usa a proteína no dia-a-dia.
"A visualização é tão importante quanto a descoberta dos fenômenos biológicos." Muotri, que por pouco não foi trabalhar com Chalfie em Columbia ("Ele queria muito que eu fosse para Nova York") , cita o exemplo da estrutura do DNA, elucidada por Francis Crick e James Watson em 1953 -usando imagens de raio-X. "Só se acreditou na teoria quando montaram um modelo onde todos "viram" o que estava acontecendo."

terça-feira, 7 de outubro de 2008

O empresário Gilmar


Leia a íntegra da denúncia que CartaCapital fez sobre os negócios de Gilmar Mendes, o presidente do Supremo

Descobertas de vírus da Aids e de câncer dão Nobel a europeus

Alemão que isolou HPV, causador de tumor cervical, fica com metade do prêmio; franceses que acharam o HIV dividem o resto

Premiação chega 25 anos depois do trabalho original de Françoise Barré-Sinoussi e Luc Montagnier sobre o agente da doença do século

CLAUDIO ANGELO
EDITOR DE CIÊNCIA

A ligação entre dois tipos de vírus e duas das maiores pragas da humanidade, a Aids e o câncer, rendeu ontem a três cientistas europeus o Prêmio Nobel em Fisiologia ou Medicina.
O alemão Harald zur Hausen, 72, e os franceses Luc Montagnier, 76, e Françoise Barré-Sinoussi, 61, dividirão a bolada de 10 milhões de coroas suecas (US$ 1,4 milhão). O primeiro ficará com metade do dinheiro, pela descoberta de que o papilomavírus humano (o HPV) causa o câncer de colo de útero. Os outros dois ratearão o restante, pela descoberta, há 25 anos, do vírus da imunodeficiência humana, o HIV.
Segundo o Comitê do Nobel, o trabalho de Montagnier e Barré-Sinoussi foi "essencial para a compreensão atual da biologia da doença e para seu tratamento". O de Zur Hausen levou à caracterização da história natural da infecção pelo HPV e ao desenvolvimento de vacinas profiláticas contra o câncer induzido pelo vírus -o segundo tumor que mais ataca mulheres, com 500 mil novos casos e 250 mil mortes por ano.
Apesar de se tratarem de duas pesquisas com vírus, os trabalhos premiados têm mais diferenças do que semelhanças. Dividir um prêmio entre duas descobertas diferentes é prática pouco comum no Nobel.
O vírus da Aids, 25 anos depois de sua descoberta, continua desafiando os cientistas. Apesar de o trabalho da dupla francesa ter aberto as portas para a criação do coquetel de remédios que deu chance de vida aos portadores de HIV -nos anos 1980, ser soropositivo era uma sentença de morte-, todas as tentativas de criar uma vacina contra ele falharam.
A Aids, reconhecida como pandemia em 1981, já matou pelo menos 25 milhões de pessoas, sobretudo na África. Estima-se que 1% da população mundial seja afetada por ela.
Já o HPV encontrou o seu algoz. O trabalho iniciado nos anos 1970 por Zur Hausen no Centro Alemão de Pesquisa do Câncer, em Heidelberg, seria coroado em 2006 com a entrada no mercado da primeira vacina anticâncer já desenvolvida. O medicamento, batizado Gardasil, previne infecção pelas variedades de HPV que causam 70% dos casos de câncer cervical, o HPV-16 e o HPV-18.
"Não estou preparado para isso", disse Zur Hausen ontem pela manhã, emocionado com a notícia do prêmio.
Montagnier, que participa de uma conferência na Costa do Marfim, dedicou o prêmio aos doentes de Aids e disse que o Nobel "nos dá coragem para continuar até atingirmos o nosso objetivo" -a cura da doença.
Barré-Sinoussi, que estava o Camboja, também foi pega de surpresa. "Confesso que estava muito longe de esperar por isso", declarou a francesa.