sexta-feira, 23 de maio de 2008

EUA vão testar terapia de DNA contra a hemofilia

Estudo tem participação da Unicamp e poderá contar com voluntário brasileiro

Nova técnica, que usa vírus alterado para corrigir gene de pacientes, pode trazer uma melhora parcial com duração de alguns anos

EDUARDO GERAQUE
DA REPORTAGEM LOCAL

O primeiro teste em humanos da eficácia de uma terapia de DNA contra a hemofilia começará nos Estados Unidos no mês que vem. O ensaio clínico contra a doença genética, que deve iniciar com nove pacientes, tem a colaboração da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) e poderá contar com voluntários brasileiros.
A técnica, desenvolvida pela Escola de Medicina da Universidade da Pensilvânia, já passou em testes de segurança. O método consiste em "dar uma cópia sadia do gene defeituoso [para o organismo]", disse à Folha o brasileiro Valder Arruda, que há uma década trocou a Unicamp pelos EUA.
Nos portadores de hemofilia tipo B -a variedade contra a qual a nova terapia de DNA foi criada-, uma mutação impede a produção do "fator 9", uma proteína fundamental para a coagulação sangüínea. O gene que a codifica é o alvo de ataque da nova terapia.
A ausência do fator 9 é que ocasiona, em diferentes níveis, os problemas típicos da doença. O hemofílico grave pode ter complicações hemorrágicas que iniciam com um simples sangramento na gengiva, por exemplo. Estima-se que uma de cada 30 mil pessoas do sexo masculino em todo o mundo seja portadora dessa variedade de hemofilia.

Crise no transporte
Para criar a nova técnica, os pesquisadores tiveram que superar um dos maiores desafios enfrentados pelas terapias gênicas experimentais: levar o gene sem defeito até o alvo.
A estratégia usada por Arruda e colaboradores, como mostrou a primeira fase do estudo, é segura. Mas só agora, nos novos testes, é que ela será testada em relação à sua eficiência.
"Nós usamos o adenovírus associado [um vírus que não causa doença em humanos] como vetor", afirma o médico brasileiro. Segundo Arruda, essa ferramenta é o que levará a cópia do gene sadio para dentro do organismo. "Esse vírus é inócuo para os seres humanos. Ele tem um poder contaminante tosco", diz o pesquisador.
Por meio de engenharia genética, o material sintético capaz de imitar o gene humano e produzir o fator 9 é montado dentro do vírus, o chamado "vetor", que será depois injetado. O próprio processo de reprodução do vírus é que entrega para as células os novos genes. Se tudo der certo, as células então começam a trabalhar sem a disfunção que os hemofílicos herdam de seus pais.
A hemofilia é bastante rara no sexo feminino exatamente pela sua característica genética. Os tipos mais comuns da doença (A e B) são ligados ao cromossomo X, de uma forma recessiva. Uma menina nasce incapaz de produzir fator 9 apenas se ela tiver um pai hemofílico e uma mãe portadora do mesmo problema. Muitas mulheres têm a disfunção genética, mas sem sintomas.

Efeito limitado
No caso do estudo em curso nos Estados Unidos, diz Arruda, a primeira fase dos testes, entre outras contribuições, serviu para que a dose da terapia fosse calibrada. Agora, os nove pacientes serão testados com novas doses. Cada conjunto de três pessoas vai receber quantidades diferentes. Os cientistas esperam que os níveis de fator 9 aumentem em todos eles.
Mas há outro problema pendente. Na primeira fase dos testes, o sistema imune de um paciente teve reação adversa ao vírus. "Por isso, agora aplicaremos um imunossupressor nos primeiros meses da pesquisa."
Com base em resultados preliminares, os pesquisadores estimam que a melhora obtida com esse primeiro modelo de terapia gênica será parcial e terá uma duração limitada a alguns anos. A palavra cura ainda não chega a ser mencionada.

quinta-feira, 22 de maio de 2008

Grupo identifica gatilho da dengue hemorrágica

Dado pode ajudar no combate de outras doenças

DA REDAÇÃO FSP

Uma descoberta de pesquisadores de Taiwan pode ajudar a combater a dengue e outros tipos semelhantes de vírus, como a febre do Nilo Ocidental e a encefalite japonesa.
Cientistas da Universidade Nacional Yan-Ming (Taiwan) identificaram uma molécula, chamada CLEC5A, que ao interagir com o vírus da dengue em camundongos ocasiona a febre hemorrágica -versão mais letal da doença. Os pesquisadores descobriram que o vírus da dengue "seqüestra" essa molécula das células imunológicas, o que desencadeia uma liberação em massa de citocinas -que são poderosos agentes inflamatórios. Os cientistas já sabem que são eles que causam a inflamação na dengue.
A pesquisa, publicada na revista "Nature", demorou três anos para ser concluída e foi realizada em animais. Os cientistas notaram que, quando a interação do vírus e da molécula é bloqueada com anticorpos, é possível evitar a inflamação sem prejudicar a resposta imunológica do organismo. Além disso, a medida permitiu que 50% das cobaias se livrassem do vírus completamente.
A dengue infecta pelo menos 50 milhões de pessoas por ano em mais de cem países e é uma grande preocupação no Brasil.
Ainda é preciso que esse tratamento passe por diversos procedimentos de validação antes de poder ser aplicado em humanos. Os pesquisadores acreditam que deve levar entre três e cinco anos para o método entrar em teste clínico.
Há quatro tipos de vírus da dengue. Normalmente, as pessoas infectadas pela primeira vez pelo vírus (qualquer um dos tipos) têm a versão mais "leve" da doença. Já no segundo contato com a dengue, há aumento do risco de o paciente desenvolver a versão hemorrágica.
O mecanismo desse tipo mais grave de desenvolvimento da doença ainda não é claro. Pesquisas recentes, por exemplo, mostram que a dengue hemorrágica também ocorre em pacientes infectados pela primeira vez.
Os pesquisadores afirmam que o maior obstáculo atualmente para o tratamento de muitas infecções virais agudas é saber como controlar a inflamação sem atenuar a imunidade contra o vírus.

Sintomas
No Brasil, são observados usualmente três tipos de vírus. Um estudo feito por pesquisadores no Estado do Amazonas, no entanto, mostrou que a dengue tipo 4 voltou ao Brasil, mais de duas décadas após ser registrada em Roraima, em 1982.
O Ministério da Saúde, porém, nega que tenham havido casos recentes.
Os sintomas da dengue clássica são dores de cabeça, cansaço, dor muscular e nas articulações, indisposição, enjôos, vômitos, manchas vermelhas na pele e dor abdominal. Eles duram até uma semana.
Já a dengue hemorrágica inicialmente se assemelha à dengue clássica, mas depois do terceiro ou quarto dia de evolução da doença podem surgir hemorragias, dores abdominais intensas, dificuldade respiratória -que podem levar à morte.

CLEC5A is critical for dengue-virus-induced lethal disease

Szu-Ting Chen1, Yi-Ling Lin2,3, Ming-Ting Huang1, Ming-Fang Wu1, Shih-Chin Cheng1, Huan-Yao Lei4, Chien-Kuo Lee5, Tzyy-Wen Chiou6, Chi-Huey Wong3 & Shie-Liang Hsieh1,3,7

1. Department and Institute of Microbiology and Immunology, National Yang-Ming University, Taipei 112, Taiwan

Nature , | doi:10.1038/nature07013; Received 29 February 2008; Accepted 18 April 2008; Published online 21 May 2008

Dengue haemorrhagic fever and dengue shock syndrome, the most severe responses to dengue virus (DV) infection, are characterized by plasma leakage (due to increased vascular permeability) and low platelet counts1, 2. CLEC5A (C-type lectin domain family 5, member A; also known as myeloid DAP12-associating lectin (MDL-1))3 contains a C-type lectin-like fold similar to the natural-killer T-cell C-type lectin domains and associates with a 12-kDa DNAX-activating protein (DAP12)4 on myeloid cells. Here we show that CLEC5A interacts with the dengue virion directly and thereby brings about DAP12 phosphorylation. The CLEC5A–DV interaction does not result in viral entry but stimulates the release of proinflammatory cytokines. Blockade of CLEC5A–DV interaction suppresses the secretion of proinflammatory cytokines without affecting the release of interferon-alpha, supporting the notion that CLEC5A acts as a signalling receptor for proinflammatory cytokine release. Moreover, anti-CLEC5A monoclonal antibodies inhibit DV-induced plasma leakage, as well as subcutaneous and vital-organ haemorrhaging, and reduce the mortality of DV infection by about 50% in STAT1-deficient mice. Our observation that blockade of CLEC5A-mediated signalling attenuates the production of proinflammatory cytokines by macrophages infected with DV (either alone or complexed with an enhancing antibody) offers a promising strategy for alleviating tissue damage and increasing the survival of patients suffering from dengue haemorrhagic fever and dengue shock syndrome, and possibly even other virus-induced inflammatory diseases.

segunda-feira, 19 de maio de 2008

Grupo cria macaco com doença humana


Generation of a transgenic model in monkeys of HD. a, b, The transgenic HD monkeys rHD-1 (left) and rHD-2 (right) are shown. Transmission light image (a) and fluorescent image (b) showing GFP expression in HD monkeys


Animais com DNA alterado servirão para estudar o mal de Huntington, desordem neurológica sem cura

DA REUTERS

Um grupo de pesquisadores dos EUA anunciou ontem ter conseguido criar macacos geneticamente alterados para contrair a doença de Huntington. Usando os animais em pesquisa, os cientistas pretendem compreender melhor essa doença neurológica hereditária sem cura para buscar novos tipos de tratamento.
O método para alterar o DNA dos animais está descrito num estudo no site da revista "Nature" (www.nature.com). Usando vírus geneticamente alterados para "infectar" óvulos, os cientistas conseguiram obter dois macacos portadores do gene causador a doença. Um deles, com dez meses, já está apresentando sintomas. Os macacos também carregam um gene que deixa sua pele fosforescente, a prova física de que o experimento deu certo.
A doença de Huntington faz um determinado subtipo de neurônios morrer precocemente. As pessoas já nascem com a mutação que causa o distúrbio, mas em geral ele só se manifesta na vida adulta. Os principais sintomas da doença são movimentos involuntários e a perda da capacidade cognitiva (memória e raciocínio) e do equilíbrio emocional.
Até agora, a biologia do mal de Huntington vinha sendo estudada sobretudo em camundongos, mas macacos têm o organismo mais parecido com o humano e devem oferecer um modelo experimental melhor.
As novas cobaias foram criadas pelo Centro Nacional Yerkes de Pesquisa em Primatas, da Universidade Emory, de Atlanta (EUA). Segundo a entidade, é a primeira vez que se altera o DNA de primatas para simular uma doença humana. A escolha do Huntington se deve ao fato de esta ser uma doença genética de origem relativamente simples, atribuível a mutações em um único gene.
"Espécies de roedores podem capturar algumas das características da doença, mas elas não têm sido satisfatórias em capturar realmente sua essência", diz Stuart Zola, chefe do Centro Yerkes. "Agora nós temos um primata não-humano geneticamente modificado que realmente apresenta os sinais clínicos que vemos nos pacientes [humanos]."
Segundo Zola, o sucesso da técnica pode abrir caminho para a criação de modelos animais mais complexos, que simulem problemas multifatoriais como os males de Parkinson e Alzheimer.
A doença de Huntington atinge até 7 em cada 100 mil pessoas, dependendo da população. Pessoas de ascendência européia são mais propensas a contrai-la do que africanos e asiáticos. Apesar de não existir cura, há tratamentos que podem retardar um pouco a mortalidade de neurônios. Após aparecerem os primeiros sintomas, porém, os pacientes morrem em cerca de 15 anos.

Towards a transgenic model of Huntington's disease in a non-human primate

Shang-Hsun Yang et al.
Nature , | doi:10.1038/nature06975; Received 7 January 2008; Accepted 9 April 2008; Published online 18 May 2008

Correspondence to: Anthony W. S. Chan1,2,3,4 Correspondence and requests for materials should be addressed to A.W.S.C. (Email: achan@genetics.emory.edu).

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Non-human primates are valuable for modelling human disorders and for developing therapeutic strategies; however, little work has been reported in establishing transgenic non-human primate models of human diseases. Huntington's disease (HD) is an autosomal dominant neurodegenerative disorder characterized by motor impairment, cognitive deterioration and psychiatric disturbances followed by death within 10–15 years of the onset of the symptoms1, 2, 3, 4. HD is caused by the expansion of cytosine-adenine-guanine (CAG, translated into glutamine) trinucleotide repeats in the first exon of the human huntingtin (HTT) gene5. Mutant HTT with expanded polyglutamine (polyQ) is widely expressed in the brain and peripheral tissues2, 6, but causes selective neurodegeneration that is most prominent in the striatum and cortex of the brain. Although rodent models of HD have been developed, these models do not satisfactorily parallel the brain changes and behavioural features observed in HD patients. Because of the close physiological7, neurological and genetic similarities8, 9 between humans and higher primates, monkeys can serve as very useful models for understanding human physiology and diseases10, 11. Here we report our progress in developing a transgenic model of HD in a rhesus macaque that expresses polyglutamine-expanded HTT. Hallmark features of HD, including nuclear inclusions and neuropil aggregates, were observed in the brains of the HD transgenic monkeys. Additionally, the transgenic monkeys showed important clinical features of HD, including dystonia and chorea. A transgenic HD monkey model may open the way to understanding the underlying biology of HD better, and to the development of potential therapies. Moreover, our data suggest that it will be feasible to generate valuable non-human primate models of HD and possibly other human genetic diseases.