sábado, 10 de maio de 2008

País não atinge meta e segue com nº alto de casos de hanseníase

Incidência foi de 2,3 doentes por 10 mil habitantes; objetivo era reduzir a menos de 1 por 10 mil

Emilio Sant’Anna OESP

O Brasil precisa resolver um problema e está oito anos atrasado. Em 2000, expirou o prazo estipulado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) para o País diminuir o número de novos casos de hanseníase para menos de 1 por 10 mil habitantes. A data foi então adiada para 2005 e, novamente, a meta não foi atingida. Ano passado, a incidência foi de 2,3 por 10 mil habitantes. Agora, o foco do Ministério da Saúde se volta para os menores de 15 anos, faixa etária em que foram registrados mais de 7 mil casos entre 2005 e 2006.

Isso indica que a transmissão da doença continua ativa, uma vez que tem período de incubação de três a dez anos. A hanseníase é transmitida pelo Bacilo de Hans. O contágio ocorre pelas vias respiratórias e o tratamento com poliquimioterápicos leva de seis meses a um ano.

“Isso é novo para nós, pois a hanseníase não é doença de jovem”, diz Maria Eugênia Noviski Gallo, pesquisadora da Fundação Oswaldo Cruz e assessora técnica do Programa Nacional de Hanseníase.

Em 2006, dos 47.612 casos registrados nas Américas, em todas as faixas etárias, 44.436 ocorreram no Brasil. Um resultado que coloca o País atrás apenas da Índia no número de novas detecções e ao lado de um grupo de países que não conseguiram reduzir a incidência da doença para níveis satisfatórios. Fazem parte desse grupo, além de Brasil e Índia, Angola, República Democrática do Congo, Madagascar, Moçambique, Nepal e Tanzânia.

FORA DO ALCANCE

De acordo com a coordenadora do Programa Nacional de Combate à Hanseníase, Maria Leide de Oliveira, a meta da OMS estava fora do alcance do País. Ela prevê que isso somente aconteça por volta de 2020. “Já sabíamos que os países mais populosos não atingiriam essa meta em 2000”, diz Maria Leide. “A hanseníase é um legado dos países mais pobres.”

Para Maria Eugênia, mais importante do que atingir a meta da OMS é o controle efetivo da doença. “Controlar a hanseníase não é apenas uma questão biológica, é principalmente socioeconômica”, afirma.

Na região Amazônica, a situação é pior. Mato Grosso, Roraima, Pará, Rondônia e Maranhão são os Estados mais endêmicos. “Os Estados que receberam fluxo migratório têm problemas maiores”, diz a coordenadora. Em números absolutos, no entanto, o Nordeste, com mais de 17 mil detecções em 2006, registra mais casos.

De acordo com a ex-diretora do Programa Estadual de Combate à Hanseníase de Mato Grosso, Eliane Esperandio, as áreas de fronteiras agrícolas do Estado são as mais atingidas. No município de Diamantino, com pouco mais de 18 mil habitantes, a incidência chega quase a 30 casos por 10 mil habitantes. “Os migrantes que vêm trabalhar aqui têm predisposição à doença e aqui entram em contato com o bacilo”, diz Eliane.

REPARAÇÃO

Para os especialistas, apesar de ainda longe das metas da OMS, o combate à hanseníase avançou no País. O alto número de casos, segundo eles, pode indicar uma melhora na detecção da doença. Outro avanço foi o reconhecimento pelo governo federal do direito à indenização dos pacientes internados compulsoriamente até 1986.

Uma medida provisória assinada pelo presidente Lula em 2007 reconhece esse direito e estabelece o valor de R$ 750 para pensão vitalícia a ser paga aos pacientes que consigam comprovar a internação.

Em setembro, uma comissão interministerial foi criada para avaliar os pedidos enviados à Secretaria Especial dos Direitos Humanos. O órgão esperava receber cerca de quatro mil pedidos. Sete meses depois, já são mais de oito mil.

Até agora, 900 casos foram analisados e 298 pensões, concedidas. Uma média de pouco mais de 40 benefícios por mês. Nesse ritmo, seriam necessários cinco anos para avaliar todos os pedidos. Muito tempo para essas pessoas, que já passaram dos 70 anos.

Um deles é o aposentado Arnaldo Rubio, de 75 anos. Internado compulsoriamente em 1939, no Sanatório Padre Bento, em Guarulhos, até os 18 anos de idade viveu isolado pelos muros da colônia, que abrigava cerca de 1,5 mil pessoas. Hoje, mora em uma casa de repouso com outros 40 ex-hansenianos.

Rubio é o responsável por organizar o pedido de pensão de cada um deles - e reclama da burocracia para conseguir uma resposta. “Eles pedem coisas como o prontuário, uma pasta cheia de papéis, que muitas vezes nem existem mais”, afirma. “Não faz sentido, pois também pedem a ficha de internação, que comprova a doença. Quem vai estar vivo quando eles conseguirem avaliar isso tudo?”, pergunta.

Segundo Sueli de Paula Dias, assessora da comissão interministerial, todas as secretarias de Saúde têm esses documentos (no caso de São Paulo, microfilmados). Para agilizar as aprovações, a comissão passa agora por uma reestruturação. “Muitas pessoas mudaram seus nomes por causa do preconceito. Hoje, quando mandam os requerimentos, temos que ajudá-los a provar que são eles mesmos”, afirma.

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