sexta-feira, 5 de outubro de 2007

Fidelidade partidária; infidelidade programática

Durante algum tempo fui contra a fidelidade partidária, acho que no início da Nova República. Achava que seria uma ferramenta que impediria o aparecimento de novos partidos e lideranças; que repetiria o velho modelo brasileiro de partidos administrados por uma burocracia (ou por coronéis) centralizada, sem atenção para as diversas características do país.

De lá para cá houve uma multiplicação de partidos, o aparecimento de partidos de aluguéis, e um sistema de presidencialismo de coalizão que abriu espaço para toda sorte de cooptação.

Por isso mesmo, considero importante a votação do STF (Supremo Tribunal Federal) de instituir a fidelidade partidária.

Por outro lado, há outra questão bastante concreta: o Brasil não dispõe mais de partidos. Os partidos que nasceram com a redemocratização envelheceram, perderam a embocadura, não são mais programáticos.

Quando se analisa a quantidade de parlamentares eleitos por votos de legendas, ou a quantidade de suplentes que assume cargos sem ter recebido votos, reforça-se a idéia de que os votos deveriam ser dos partidos. Mas quando se vê esse enorme vácuo político no horizonte, temo que a legislação possa ser um empecilho à formação de novos partidos.

Tomo o meu caso. O PT não me satisfaz. Tinha alguma esperança no PSDB não-fernandista. Hoje esse núcleo não existe mais, com alguns dos melhores quadros se aliando a uma direita raivosa e a um jornalismo de esgoto, achando que é o caminho para o poder.

Jamais vou me filiar a partidos. Mas teria imensa simpatia por um partido não-ideológico, de cunho nacionalista, porém sem xenofobia, que soubesse somar sem preconceitos os diversos ativos que compõem o país hoje em dia: a recuperação do papel do Estado; o fortalecimento das pequenas empresas; a continuidade das políticas sociais atuais, com ampla prioridade para saúde e educação; o fortalecimento da grande empresa nacional, mas dentro de uma estratégia de consolidar cadeias produtivas de pequenas empresas; a defesa intransigente do emprego e da produção nacional; o controle dos fluxos de capitais; os pactos com multinacionais, para atrair investimentos produtivos para o país; a implantação da gestão em todos os níveis de governo.

Um partido como esse conseguiria atrair inúmeros quadros dos demais partidos. Mas qual a chance disso acontecer?

Existe um mundo real e o mundo da política. O mundo real não está muito ligado nessas coisas. Nos ambientes que freqüento, de reuniões empresariais aos botecos, essa discussão não prospera muito. Entre empresários há um sentimento difuso de preconceito em relação ao Lula, muito mais como resultado da campanha de mídia. Em vários setores empresariais – como na construção civil -, Lula é idolatrado. Em outros – especialmente pequena e média empresa e setores exportadores -, é detestado. Em alguns setores sumamente beneficiados, como o mercado financeiro, é suportado. Mas não há ideologia: há interesses.

No mundo da política (e da parcela mais oportunista da mídia) a discussão regrediu cinqüenta anos, para um plano ideológico que não existe mais em nenhuma parte do mundo. De um lado, discutindo Mao, Fidel, a Guerra Fria, pedindo queima de livros e tentando enquadrar o governo Lula em um modelo ideológico que, nem quando o modelo estava vivo, Lula embarcou. Na outra ponta, a desconfiança em relação ao lucro, aos modelos de gestão. Tudo isso compõem um quadro tão antigo quanto a Guerra Fria. Parece que o Almirante Penna Botto saiu do túmulo, e está sapateando no cemitério de braços dados com Prestes.

A fidelidade partidária induzirá os partidos a serem mais programáticos ou, pela falta de alternativas, acirrará esse jogo primário? Essa é a questão.

Luis Nassif

Nenhum comentário: