domingo, 1 de junho de 2008

Perfil genético melhora combate ao câncer

Biomarcadores identificam caracteristicas específicas de tumor para usar medicamento de maior eficácia no tratamento

Precisão sobre tumor e tratamento com terapias-alvo auxiliam médicos a escolher quais pacientes podem ser beneficiados

CLÁUDIA COLLUCCI
DA REPORTAGEM LOCAL FSP

O tratamento do câncer está se tornando cada dia mais individualizado, tendo como base o perfil genético de cada tumor e de cada paciente. A chave para essa nova realidade está no desenvolvimento de biomarcadores -agentes que reconhecem substâncias ou características específicas do tumor e se ligam a ele- já disponíveis no Brasil.
Esses testes, associados a drogas chamadas de terapias-alvo -que permitem que apenas as células cancerígenas sejam alvo do remédio- estão tornando os tratamentos mais eficazes, e a expectativa dos médicos é que sua utilização também tenha impacto no custo social dessas novas terapias.
Na prática, em vez de usar drogas oncológicas caras -que chegam a custar R$ 30 mil mensais- para todos os pacientes com um determinado tipo de tumor, os médicos terão ferramentas para escolher quais pacientes vão se beneficiar com o tratamento e descartar o uso nos demais.
"Em vez de utilizar um remédio em cem pessoas para que só dez delas se beneficiem, você vai usar apenas nas dez em que ele funciona", diz o médico Auro Del Giglio, coordenador do programa de oncologia do Hospital Israelita Albert Einstein.
"As terapias-alvo são caríssimas e a alternativa mais esperta é definir o perfil de quem deva recebê-las", diz Giglio.
Estudos que serão divulgados hoje em um congresso mundial de câncer em Chicago (EUA) vão mostrar que a presença da mutação de um gene (K-ras) em um grupo de pacientes com câncer de colorretal provoca resistência ao uso de uma dessas terapias-alvo, o cetuximabe (Erbitux).
"Você não expõe metade dos pacientes que receberia a medicação sem benefício. Você tem uma economia financeira e de efeitos colaterais em alguém que tomaria o remédio sem chances de benefícios", diz Paulo Hoff, que dirige áreas de oncologia do Hospital Sírio Libanês e do Hospital das Clínicas de São Paulo.
Segundo ele, o K-ras como biomarcador está sendo utilizado experimentalmente no Brasil. Outros testes, para tumores de mama e do sistema gastrointestinal, já são usados como rotina em centros oncológicos de ponta do país.
Conhecer o perfil genético do tumor é importante porque um mesmo tipo de câncer pode se comportar e reagir aos tratamentos de modo diferente. Além disso, o câncer é mutável e pode fazer o paciente deixar de responder a uma terapia.
As terapias-alvo têm ação específica: algumas, por exemplo, agem nas moléculas responsáveis pela divisão das células cancerosas, impedindo que elas se multipliquem de forma desordenada, e outras agem para o tumor parar de crescer.

Custo
Grande parte dessas terapias-alvo não está disponível no SUS e nem é coberta pelos planos de saúde. O recurso cada vez mais freqüente para a aquisição dessas drogas tem sido ações judiciais, que comprometem o orçamento da saúde de Estados e municípios.
O cirurgião oncologista Benedito Mauro Rossi, do Hospital AC Camargo, diz que em razão do custo e da alta especificidade desses tratamentos, a indicação deve ser restrita a casos com comprovação do benefício. "Não podemos perder o foco no custo-benefício e nas evidências científicas publicadas."
Auro Del Giglio, do Einstein, cita um exemplo de dilema sofrido no serviço público -ele também atua no setor de oncologia da Faculdade de Medicina do ABC.
"Eu, com R$ 100 mil, consigo pagar a quimioterapia ambulatorial de todas as crianças que a gente trata. Aí a gente tem um teste [genético do tumor] que custa R$ 5.000. Eu faço 20 testes e não dou quimioterapia para as crianças?", questiona.

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