sexta-feira, 28 de março de 2008

Pela expansão do ensino superior público

Só 13% dos brasileiros entre 18 e 24 anos freqüentam o ensino superior. Nos países da OCDE, a porcentagem é, em média, de 30%
FSP
É UM truísmo dizer que o desenvolvimento e a riqueza das nações estão diretamente relacionados ao número de seus habitantes com acesso a ensino superior de qualidade. Entretanto, a constatação por si só não tem o condão de mudar a realidade histórica. Nesse contexto, os números relativos ao ensino superior no Brasil, embora apresentem progressos nos últimos anos, permanecem desapontadores.
Dados recentes mostram que apenas 13% dos brasileiros entre 18 e 24 anos freqüentam o ensino superior.
Nos países da OCDE, essa porcentagem é, em média, de 30% e, na Coréia do Sul, de 60%. De resto, apenas 9% da população brasileira conclui o ensino superior, contra 26%, na média, nos países da OCDE.
No final do ano passado, a Unicamp promoveu um fórum sobre o tema em que estudiosos e dirigentes universitários relataram experiências e projetos desenvolvidos no Brasil, na União Européia e nos EUA. A explanação de John Douglass, pesquisador da Universidade da Califórnia (Berkeley), foi um ponto alto da discussão.
Douglass apresentou dados sobre a distribuição dos 3 milhões de estudantes matriculados nas instituições públicas do ensino superior nesse que é o mais populoso Estado americano.
No sistema norte-americano, 74% das instituições são públicas -um predomínio expressivo-, 20% são instituições privadas sem fins lucrativos e 6% são privadas com fins lucrativos. Nesse sistema, aproximadamente 36% da população norte-americana concluiu o ensino superior.
Os dados de Douglass mostram que nos dez campi da UC -um sistema multicampi de universidade classificada como "de pesquisa", semelhante às três estaduais paulistas- estão matriculados 180 mil alunos em cursos de graduação. Já os 23 campi da UEC (Universidade do Estado da Califórnia) -também pública, mas, diferentemente da UC, quase exclusivamente destinada ao ensino de graduação- recebem 370 mil estudantes.
Os outros quase 2,5 milhões de matriculados freqüentam os 107 "community colleges", voltados para a formação geral, vocacional e profissionalizante, com cursos de dois anos, presentes em grande parte dos municípios da Califórnia.
Nos Estados Unidos, segundo Douglass, cerca de 40% dos municípios têm pelo menos um "college" ou universidade. Ressalte-se que há mobilidade dentro do conjunto das instituições públicas: um estudante pode, por exemplo, terminar o "community college" e ingressar na UEC ou na UC.
Esse sistema foi consolidado em 1960, quando a Califórnia aprovou seu plano diretor de ensino superior, resultado de planejamento cuidadoso e de longo prazo. O plano se traduziu em um dos mais completos, abrangentes e qualificados sistemas de ensino superior nos EUA.
O quadro apresentado contrasta agudamente com o que emerge dos dados nacionais. Dos 5,3 milhões de matriculados no ensino superior brasileiro, 25% estão em instituições públicas (Pnad/IBGE, 2006). No Sudeste, essa porcentagem é ainda menor (em São Paulo, está em torno de 15%).
Merece menção o fato de todos os dados disponíveis mostrarem que as universidades públicas são as melhores do país e as únicas em que pesquisas com qualidade reconhecida e em larga escala são realizadas.
Outro dado significativo: no Brasil, segundo dados do Inep/MEC para 2006, apenas 2% dos matriculados no ensino superior cursam programas com caráter vocacional ou profissionalizante. O número para a Coréia do Sul é de 50%.
As propostas e considerações sobre o futuro do ensino superior no Brasil discutidas no fórum da Unicamp apontam a urgente necessidade de ampliar a participação de instituições públicas no ensino superior do Brasil e aumentar o número de jovens com educação superior no país para valores próximos das médias da OCDE.
Numerosos exemplos indicam que esse incremento pode e deve ocorrer em um sistema diversificado de ensino superior sem comprometer a qualidade e sem inviabilizar as várias universidades públicas de comprovada excelência hoje existentes.
Experiências bem-sucedidas em outros países devem ser analisadas com cuidado, dadas as peculiaridades do sistema educacional brasileiro. No entanto, o exemplo da Califórnia mostra que a importância do planejamento a longo prazo, a grande abrangência e a diversidade do ensino superior público, a mobilidade estudantil entre as diversas instituições e a avaliação periódica de desempenho merecem ser levados em consideração nas ações futuras relacionadas ao ensino superior no Brasil.

FERNANDO FERREIRA COSTA , 57, é professor titular da Faculdade de Ciências Médicas e vice-reitor da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas).

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