Temendo discriminação por planos de saúde e empregadores, americanos deixam de fazer testes de DNA
AMY HARMON
DO "NEW YORK TIMES"
Victoria Grove, de Woodbury, Minnesota, queria descobrir se estava predestinada a sofrer do tipo de enfisema que afetava várias pessoas de sua família, mas não queria pedir a seu médico o exame de DNA que lhe daria a resposta.
Ela temia não conseguir plano de saúde ou emprego se a predisposição genética à doença aparecesse em seus arquivos médicos, especialmente porque o tratamento da doença, a deficiência de alfa-1 antitripsina, custaria mais de US$100 mil por ano. Em vez disso, procurou um serviço que enviou a sua casa um kit para ela própria colher o material para o exame.
Quando o exame revelou que era virtualmente certo que ela desenvolveria a doença, Grove não informou seu médico sobre o fato. Como estava ciente de que poderia sofrer danos pulmonares se seus episódios de pneumonia não fossem tratados imediatamente, ela procurava a clínica médica ao primeiro sinal de infecção.
Os primeiros e ansiosamente aguardados benefícios da medicina personalizada estão sendo perdidos ou diluídos para muitos americanos que, por temer que informações genéticas possam ser usadas contra eles, deixam de aproveitar sua disponibilidade crescente.
Médicos dizem que, em alguns casos, pacientes que poderiam tomar decisões de saúde mais bem fundamentadas se descobrissem se possuem ou não um risco elevado de sofrer doenças como câncer se negam a fazê-lo devido às conseqüências potencialmente negativas.
Outros ingressam numa espécie de clandestinidade genética, gastando centenas ou milhares de dólares do bolso para fazer exames de DNA que seriam cobertos por seus planos de saúde, para evitar serem sujeitos a escrutínio. Aqueles que descobrem que têm certeza ou alta probabilidade de apresentar uma doença genética freqüentemente imploram aos médicos que não mencionem o fato em seus arquivos.
Alguns pacientes procuram não revelar suas informações aos médicos. E até mesmo médicos que recomendam que seus pacientes façam exames de DNA lhes avisam que eles podem enfrentar discriminação genética por empregadores ou convênios médicos.
Esse tipo de discriminação parece ser raro. Mas as pessoas acostumadas a um sistema de seguro-saúde em que riscos conhecidos implicam em penalidades financeiras estão tirando as próprias conclusões quanto à provável reação suscitada por uma predisposição genética conhecida a uma doença.
Em conseqüência disso, a capacidade de prevenir e tratar doenças genéticas com mais eficácia está diminuindo.
"Está bastante claro que o público teme fazer uso dos exames genéticos", disse Francis S. Collins, diretor do Instituto Nacional de Pesquisas do Genoma Humano. "Se essa situação continuar, o futuro da medicina que todos gostaríamos de ver acontecer corre o risco de morrer antes de decolar."
Para Grove, 59 anos, foi impossível manter sua doença em segredo. Quando seus sintomas se agravaram, ela foi instruída a voltar à clínica antes que lhe fossem receitados antibióticos. Mas naquele dia tinha ocorrido uma nevasca e ela não estava se sentindo apta a dirigir até a clínica.
Ela se recorda de chorar ao telefone: "Tenho alfa-1. Preciso desse antibiótico"!
Grove se deixou identificar nesta reportagem porque, para o bem de outras pessoas, sentiu-se na obrigação de chamar a atenção da opinião pública para a situação em que se encontra. "Alguma coisa precisa ser feita para que as pessoas não possam ser discriminadas quando tomam conhecimento desses riscos", afirmou.
Os empregadores dizem que a discriminação no local de trabalho já é proibida e que as leis já existentes regem a privacidade dos registros médicos. Mas os defensores dos direitos dos empregados dizem que não há nada nessas leis que impeça explicitamente que empresas que têm custos médicos crescentes evitem contratar funcionários que elas sabem que têm probabilidades maiores de adoecer no futuro.
Os tribunais ainda não assumiram posição sobre o assunto. Quando, em 2002, a Comissão de Igualdade de Oportunidades de Emprego processou a ferrovia Burlington Northern Santa Fe por fazer exames sangüíneos secretos de funcionários que tinham movido ações indenizatórias por síndrome de túnel do carpo, numa tentativa de descobrir uma causa genética dos sintomas, o caso foi resolvido extrajudicialmente.
Os convênios médicos dizem que não pedem a seus potenciais clientes os resultados de exames genéticos, nem exigem que eles façam esses exames. "É um receio infundado", disse Mohit Ghose, porta-voz da America's Health Insurance Plans. "Nosso setor não tem interesse em praticar discriminação com base genética."
Um estudo recente do Instituto de Política de Saúde da Universidade Georgetown chegou a uma conclusão diferente. Em sete de 92 decisões relativas à aceitação de clientes, os convênios disseram que negariam cobertura, cobrariam mais pelos planos médicos ou excluiriam certas condições da cobertura, com base em resultados de exames genéticos.
O custo médico
Muitos profissionais da saúde dizem que, independentemente de a discriminação ocorrer ou não de fato, a ansiedade que ela suscita exige medidas legislativas. Os geneticistas reclamam que o medo da discriminação os impede de recrutar participantes em pesquisas, atrasando o descobrimento de tratamentos de doenças. No Centro de Tratamento de Câncer Memorial Sloan-Kettering, em Nova York, a mesma preocupação é uma das principais razões que levam pacientes a cancelar exames que poderiam detectar riscos de câncer.
"Estamos falando de intervenções com potencial de salvar vidas", disse Kenneth Offit, chefe do serviço de genética clínica do centro. "É uma tragédia que as pessoas estejam assustadas pela possibilidade de sofrerem discriminação."
domingo, 2 de março de 2008
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