Novo instituto estudará regiões do DNA que antes eram tidas como irrelevantes, mas podem estar por trás de doença Estudo genético feito por novo centro de pesquisa paulista visa criar testes prognósticos para cânceres de próstata e de mama Caio Guatelli - 16.mai.2007/Folha Imagem
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O pesquisador Sergio Verjovski em seu laboratório na USP EDUARDO GERAQUE DA REPORTAGEM LOCAL FOLHA
As diferenças que o DNA tem de uma pessoa para a outra podem ajudar a entender melhoro o surgimento do câncer. Com base nessa premissa, e munidos de uma supermáquina, cientistas brasileiros começam a buscar um "perfil genético" dos cânceres de próstata e de mama.
Durante a próxima década, no mínimo, Sergio Verjovski-Almeida, do Instituto de Química da USP (Universidade de São Paulo) estará reunido a Ricardo Brentani e Luis Paulo Kowalski (ambos do Hospital A.C. Camargo), além de vários colaboradores, no Incito (Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Oncogenômica), para pesquisar o assunto. O centro de pesquisa é uma das 101 novas instituições criadas na semana passada.
"Nós já sabemos que os genes "não-codificadores" de proteínas são bastante específicos para determinados tecidos", disse Verjovski-Almeida à
Folha.
Em palavras não-técnicas, isso significa que aquilo que era considerado lixo genético cinco anos atrás (pedaços de DNA que não participam da formação das proteínas), hoje é tido como importante para a regulação das atividades biológicas e podem sinalizar o grau de agressividade de um câncer.
Pesquisas feitas anteriormente na USP já demonstraram que em 74% de todos os genes humanos existe algum trecho de "DNA-lixo" útil. "Eles passam alguma mensagem que pode desligar ou ligar determinadas vias bioquímicas [processos biológicos]", afirma Verjovski-Almeida.
O grupo do Incito, com base nesses dados gerados nos últimos anos sobre a importância do DNA-lixo, vai vasculhar as regiões não-codificadoras de proteína do genoma humano justamente para achar quais delas regulam os cânceres de próstata e de mama.
Prognóstico "Ao todo, vamos estudar a amostra de 400 pacientes que já desenvolveram a doença na próstata", diz o bioquímico da USP. Os tumores de próstata foram todos coletados no Hospital A.C. Camargo. Os de mama (mais 400) são de um hospital dos Açores, Portugal.
De acordo com Verjovski-Almeida, será possível, no fim do projeto, que deve durar pelo menos três anos, ter um perfil genético dos tumores estudados. Além dos genes já conhecidos envolvidos com a doença, os cientistas tentarão saber quais trechos do DNA-lixo participam da regulação dos dois tipos de câncer. "Teremos então um teste prognóstico", diz.
No caso de quem já desenvolveu a doença, o perfil genético pode servir para os médicos saberem não apenas o risco de a doença voltar, mas com qual grau de agressividade. "Será possível decidir qual tipo de tratamento é mais indicado."
Conhecer o DNA não-codificante é estudar "uma fração maior do universo", diz Verjovski-Almeida. O Incito será bancado por verbas do MCT (Ministério de Ciência e Tecnologia), que promete cobrar com rigor os resultados das pesquisas. O instituto também avaliará amostras de famílias com câncer hereditário. "Também neste caso vamos atrás da variabilidade, das alterações no número de cópias de genes", diz o cientista da USP.
Após descartar o fato de que os tumores apareceram em uma mesma família por causa de uma mutação já conhecida, os cientistas vão atrás de regiões de DNA que não-codificam proteínas mas que sejam suspeitas de controlar os tumores. As pessoas analisadas serão aquelas que não apresentam as mutações mais comuns associadas ao câncer de mama, mas que desenvolveram a doença.
No futuro, a existência de perfis genéticos de certos tipos de câncer poderá ajudar todas as pessoas. "A idéia é que os perfis possam serem usados em testes no próprio SUS", afirma o pesquisador da USP.
Supermáquina lê milhões de "letras" de DNA em horas DA REPORTAGEM LOCAL
Uma máquina ultra-rápida de seqüenciamento genético -uma das duas que existem em instituições públicas no país- opera a todo vapor desde segunda-feira no Instituto de Química da USP (Universidade de São Paulo).
Avaliado em R$ 1,4 milhão, o equipamento permite que 1,2 milhão de seqüências de DNA sejam analisadas em dez horas. Segundo os pesquisadores, essa tecnologia é essencial para obter bons resultados nos trabalhos -e aproveitar melhor o talento de bons cientistas.
"Sete anos atrás, no projeto genoma do câncer, foram necessários dois anos, 35 laboratórios e US$ 12 milhões para fazer o mesmo trabalho", afirma Sergio Verjovski-Almeida, que na semana passada mostrou, com vibração, seu novo laboratório à reportagem da
Folha. "O custo de uma rodada de 10 horas, hoje, está em US$ 13 mil", diz o pesquisador da USP.
No novo CATG (Centro Avançado de Tecnologias em Genômica) não são apenas amostras de tumores que serão processadas nos próximos meses. Uma máquina desse porte pode fazer muito mais. Segundo Verjovski-Almeida, outros três projetos serão desenvolvidos em paralelo ao estudo dos perfis genéticos do câncer.
Haverá a análise de 8 milhões de seqüências de DNA de cana-de-açúcar, que buscará trechos de interesse agronômico do genoma da planta. Também serão estudadas 4 milhões de seqüências genéticas do parasitas humanos Schistosoma mansoni (causador da esquistossomose) e Leishmania braziliensis (leishmaniose).
Nos dois últimos casos, o objetivo dos grupos de pesquisa é obter novas informações genéticas que possam ajudar no controle das doenças causadas por esses patógenos.
(EG)